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Ano XIX - nº 43
PROJETO DE LEI NÚMERO 2.481/2022 – REFORMA DO PROCESSO ADMINISTRATIVO FEDERAL
12 de junho de 2025 | NotíciasEncontra-se em trâmite no Congresso Nacional o Projeto de Lei 2.481/2022, da autoria do Senador Rodrigo Pacheco. Tal Projeto visa alterar a Lei nº 9.784/1999 e se mostra como uma oportunidade de tornar o processo administrativo mais eficiente e moderno, inclusive permitindo-se autocomposição entre a Administração e os administrados.
O Projeto já foi discutido na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e na Comissão Temporária para exame de projetos de reforma dos Processos Administrativo e Tributário Nacional da Câmara dos Deputados e atualmente encontra-se no Plenário do Senado Federal.
As regras contidas no PL, se aprovadas, valerão não apenas no âmbito da Administração direta e indireta Federal, mas também para a Administração dos Estados e os Municípios, de forma a unificar as regras do processo administrativo em âmbito nacional.
Passamos a expor abaixo alguns dos pontos importantes de referido PL.
Processo Eletrônico e Uso de Inteligência Artificial
O PL especifica que os processos administrativos devem tramitar preferencialmente sob a forma eletrônica, o que já é realidade no âmbito dos processos judiciais. O objetivo é a padronização, visando celeridade processual e maior transparência.
O PL tem também disposições específicas sobre o uso de tecnologias de inteligência artificial (IA) no processo administrativo. A utilização de IA visa modernizar os procedimentos, garantir mais eficiência e celeridade, desde que não comprometa os direitos dos administrados.
De acordo com PL, a utilização de sistemas de IA deve observar os princípios da transparência, auditabilidade e possibilidade de revisão humana. Outro ponto de destaque é a preferência de utilização de IA com códigos abertos (código fonte aberto para uso de todos os participantes e colaboração), para facilitar o treinamento de ferramentas e seu desenvolvimento em ambiente colaborativo, com integração entre diversos Órgãos.
Além disso está previsto que a implementação de IA nos processos administrativos seja precedida de regulamentação específica, estabelecendo critérios objetivos para seu uso e mecanismos de explicações das decisões automatizadas. Aguarda-se regulamentação que possivelmente seguirá os moldes da regulamentação do uso de IA em processos judiciais, já prevista na Resolução do Conselho Nacional de Justiça n° 615/2025. Tal Resolução estabeleceu diretrizes para desenvolvimento, utilização e governança de Inteligência Artificial no Poder Judiciário.
Negócio Jurídico Processual Administrativo
O Art. 25-A do PL prevê que Órgãos públicos e Administrados podem firmar negócios jurídicos processuais administrativos, adequando-se o procedimento daquele processo à realidade do caso concreto.
Este instituto pode parecer uma novidade, mas o Código de Processo de Civil de 2015 já prevê a possibilidade da celebração de negócios jurídicos processuais, no seu artigo 190. Os negócios jurídicos processuais podem ser entabulados nos processos que permitem autocomposição, de forma que as partes podem fazer mudanças no procedimento para que fique ajustado às especificidades da causa.
Assim, as partes juntamente com o Juiz podem, por exemplo, dispor sobre a fixação de um calendário para prática dos atos processuais[1].
Na proposta do PL se prevê a possibilidade do negócio jurídico processual, mas apenas após manifestação do Órgão jurídico que iniciou o processo. Há previsão para fixação de calendário para prática de atos processuais, de comum acordo entre as partes e o Órgão administrativo.
A permissão para negócios jurídicos processuais é um avanço, no sentido de flexibilizar o procedimento administrativo e permitir que os processos se baseiem em consensualidade entre a Administração Pública e os Administrados, assim se tornando mais céleres e eficientes.
Mediação e Arbitragem
O PL prevê o uso de métodos alternativos de resolução de conflitos, como a arbitragem e a mediação, no âmbito da Administração Pública. A adoção da mediação e da arbitragem são muito bem-vindas nos processos administrativos em geral e poderá torná-los muito mais eficientes e rápidos. Entretanto, os meios alternativos de resolução de conflitos somente poderão ser utilizados caso o administrado concorde, conforme previsto pela Lei de arbitragem[2].
Contagem de Prazos em Dias Úteis
A contagem dos prazos em dias úteis (Art. 69-B do PL) pode parecer uma alteração simples, mas tem grande impacto na condução dos processos administrativos. Atualmente, os prazos são contados em dias corridos, o que penaliza os administrados que são autuados, haja vista que contam com prazos curtos para contratação de advogado e apresentação de defesas e manifestações.
Com a mudança, os Administrados terão um tempo mais justo para se defender e apresentar documentos, cumprindo com os preceitos de proporcionalidade e razoabilidade aplicados ao processo administrativo.
Outrossim, a contagem de prazo em dias úteis harmoniza a contagem de prazos nos processos judiciais e nos processos administrativos.
Prazos para Conclusão da Fase de Instrução e Fase Decisória
A incerteza sobre a duração dos processos administrativos é um problema. Muitas vezes, os processos se prolongam por anos sem uma perspectiva de sua finalização.
O PL 2.481 dispõe que o prazo para conclusão da fase de instrução processual será de até 60 dias e o prazo para que seja proferida a decisão administrativa será de 30 dias (Art. 49). Além disso, o prazo máximo para a conclusão do processo será de 6 meses, salvo exceções previstas em Lei.
Se houver Lei específica sobre processo administrativo próprio (por exemplo, processo administrativo no âmbito do MAPA, da ANVISA, da ANATEL, etc), que preveja prazo diverso para conclusão da fase de instrução processual referida acima, o prazo da Lei específica prevalecerá, conforme está previsto no artigo 29, §3° do PL.
Ausência de Manifestação da Administração
Uma das propostas do PL para garantir mais efetividade do processo administrativo é estabelecer prazos claros para a conclusão dos processos e consequências para a inércia da Administração.
Dentre as disposições, destaca-se que a omissão da Administração poderá resultar na transferência de competência ou no indeferimento tácito do pedido, conforme a natureza da demanda.
Outrossim, o PL prevê expressamente que a ausência de decisão, nos prazos previstos no projeto, caracteriza violação de direito líquido e certo, o que poderá facilitar a obtenção de tutelas judiciais em determinadas situações.
Essas medidas visam garantir maior eficiência e responsabilização da Administração Pública, assegurando que os administrados não sejam prejudicados pela demora da atuação do Poder Público.
Processo Administrativo Sancionador
- Previsão Expressa da Retroatividade da Lei em Benefício do Administrado
Não é incomum que no curso dos processos administrativos sejam publicadas Leis, Portarias e normas infralegais que tem impacto direto na matéria discutida no processo. Contudo, por vezes, as disposições de tais normas têm impacto negativo ao Administrado, como por exemplo no caso de fixação de penalidades mais gravosas. O PL prevê expressamente que no processo sancionador a Lei só pode retroagir em benefício do administrado (Art. 68-A).
Na prática, isto significará que novas regras mais favoráveis podem ser aplicadas aos processos em andamento.
- Garantia de Imparcialidade das Decisões
O parágrafo quarto do artigo 68-G prevê que as atividades realizadas no curso da investigação, sindicância, acusação e julgamento, nos processos administrativos sancionatórios devem ser segregadas e realizadas por agentes públicos diferentes. Ou seja, não pode haver acúmulo de funções de forma que quem julga não pode ser o mesmo agente da Administração que investigou, ou apurou a infração. Desta forma se garante imparcialidade, pleno exercício de defesa do Administrado e respeito ao princípio do devido processo legal previsto no artigo 5o, inciso LIV da Constituição Federal.
Considerações Finais
Na PRÁTICA, as alterações propostas pelo PL 2.481/2022, se aprovadas, contribuirão para que o processo administrativo se torne mais uniforme, aplicando-se as mesmas regras nas diversas esferas do Governo e Agências reguladoras, assim como para que se torne mais eficiente, atual e garanta os direitos dos administrados.
O presente artigo tem cunho meramente informativo e não se constitui em opinião ou aconselhamento legal. Cada caso requer a sua avaliação específica, com base em suas peculiaridades e histórico individual.
BRENTANI RONCOLATTO ADVOGADOS
[1] Art. 191. De comum acordo, o juiz e as partes podem fixar calendário para a prática dos atos processuais, quando for o caso. – Código de Processo Civil
[2] Lei 9.307/96, art. 3º.